Horto. Foto: Francisco Ferreira.
Crime e Castigo
Ontem
estava recordando para os meus filhos uma passagem ruim da minha adolescência.
Passagem de que até hoje trago as marcas - não traumas -, mas que são marcas
que não foram de todo ruins pois proporcionaram enorme e valoroso aprendizado.
Quando eu cursava a sexta série (atual sétimo ano), estudava no Instituto São
Joaquim, escola particular administrada pelas freiras Clarissas Franciscanas e
gozava de ampla confiança dos meus pais que me entregavam o dinheiro das
mensalidades e, de posse deste valor e mais o carnê de pagamentos que sempre
ficou em meu poder, ia até a agência da antiga Minas Caixa e efetuava o
pagamento. Sempre em dia.
No
mês de março daquele ano, 1980, cheguei da agência bancária e atirei o carnê
sobre o guarda-roupas e o danado caiu entre o móvel, que era enorme e quase
todo em madeira maciça e a parede em que ficava encostado, o que fez servir de
sepultura ao bloco de mensalidades. No mês de abril, como de costume, me
passaram o dinheiro e eu, não achando o talão e com medo das represálias
costumeiras, guardei o numerário, não falei que havia perdido o bendito e nem
providenciei de ir à secretaria da escola pedir uma segunda via. Nos meses de maio
e junho, a situação se repetiu e, justamente, neste último, a tentação falou
mais alto. Era Jubileu (a nossa festa maior) e eu gastei parte do dinheiro, com
a intenção de repor depois. Um pensamento e ação temerários, uma vez que não
trabalhava e teria que pedir a alguém, sob alegação de qualquer necessidade, o
valor para cobrir o desfalque. Não consegui fazer a reposição e acabei por
gastar todo o restante. Daí, como se diz aqui na roça: “nem angu e nem biju.” No terceiro mês de atraso, a secretaria da
escola convocou o meu pai e “a casa caiu”.
Meu pai me levou até aquele órgão do colégio, me fez confessar o erro, requereu
uma segunda via, deu-me o dinheiro das mensalidades – como sempre fez - e
mandou-me à caixa, efetuar o pagamento e desceu para “esperar-me em casa”.
Nesta
época eu era aficionado por coleções: bolinhas de gude, canivetes, figurinhas
futebol cards e as minhas grandes paixões: gibis do Tex (mais de cem), do
Zagor, entre tantos outros. Tinha também bolas de futebol, uniformes de clubes,
“manivelas” de soltar pipas (aprumar
papagaio – que é como falávamos) e outros brinquedos mais. Quando cheguei em
casa, tudo aquilo estava numa pilha no terreiro e meu pai atirou álcool por
cima e botou fogo.Doeu muito ver o meu tesouro ser confiscado daquela maneira,
mas cabe uma reflexão: hoje, normalmente não faríamos isto, chamaríamos o filho
para conversar, explicaríamos que aquilo foi errado, far-lhe-íamos prometer que
jamais voltaria a cometer o erro e, muito provavelmente, daríamos um castigo do
tipo: não usar computador ou celular por um período, mas que acabaríamos sendo
driblados ou esquecendo do castigo. No meu caso, a lição foi duríssima, eu
tinha revistas raras do Tex, que eu jamais voltei a encontrar, mas aprendi a
lição do quanto é bom ser honesto e hoje agradeço muito ao meu pai por isto e,
na época, agradeci a e ele e ao Universo, por não ter levado uma “pisa” daquelas. Pois eu bem mereci. Sou
contra a violência de qualquer natureza, mas que um castigo bem direcionado
funciona, isto não tem como negar.
Uma
boa semana a todos e sem castigos.
Publicação da semana em minha coluna FIEL DA BALANÇA no blog OCEANO
NOTURNO DE LETRAS - Rio de Janeiro - RJ), em 1º/8/17.
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