Flores Silvestres. Foto: Francisco Ferreira.
Maledicências
Há
mais de quarenta anos atrás existia em nossa região duas formas de comunicação sui generis que eram o Pasquim (que as
pessoas diziam Pisquim) e o
Testamento do Judas – a deixa do Juda
-. Eram textos de humor em quadras ou sextilhas que normalmente ressaltavam
características negativas das pessoas em foco ou relatando algum fato engraçado
ou de denodo da vida dos mesmos. O Pasquim era muito usado nas campanhas
eleitorais para menosprezar os candidatos adversários ou desmoralizar seus
companheiros mais próximos. Sempre eram escritos pelos desafetos daqueles e
tratava-se de textos anônimos, embora em muitos casos, sabia-se quem os escrevia.
Há notórios autores de pasquim que por questões de não querer gerar polêmicas
com eles ou seus familiares, não vou declinar seus nomes. Mas sempre houve
pérolas e quadras engraçadíssimas, como a seguinte:
“Chamei
fulana de rato,
Fulana
nem se importou.
Chamei
o rato de Fulana
E
o rato se matou”
Eram
deixados em locais de grande circulação e passavam de mão em mão até chegar à
pessoa retratada.
No
caso do Testamento do Judas o mesmo era lido antes da famigerada Malhação do
Judas, nos sábados de Aleluias, prática que foi abandonada quando se tomou
consciência de que era um ato de incentivo à violência e o ato de se fazer
justiça com as próprias mãos, além de que qualquer crime, depois de quase dois
mil anos, já estaria prescrito e com sua pena cumprida. Gerava sempre muita
expectativa e alguma confusão com os valentes de plantão que diziam: “Se ler
esta deixa para mim, eu mato e faço e aconteço!”, já que sempre se faziam
spoilers dos textos. E, normalmente, neste caso se conheciam o autor ou autores.
Algumas, com mais de quarenta anos, de que ainda me lembro:
“O
Seu Fulano de tal,
por
não ter o que fazer,
assentou
um alambique,
sem
ter cana para moer,
vai
moendo tiririca
até
a cana crescer”.
(Que ressalta o caso de um fazendeiro que construiu um alambique
antes de plantar as canas).
“Hoje eu vou pro inferno,
amanhã
vou pras profundas,
levo
meu compadre fulano
com
a trouxa na cacunda!”
(Sobre um amigo nosso que não dispensava uma “capanga” de
lona onde quer que fosse.)
“Seu Fulano de tal,
vermelho
que nem pó de urucum,
deixo
a minha caveira
para
consoar o seu jejum”.
(Falando de um outro amigo solteirão e que segundo consta
vivia em completo celibato involuntário).
E, dessa forma, nosso povo se
divertia e falava mal da vida dos outros mas com muito bom humor e poesia.
Assim como desejo que seja nossa semana.
Publicação em minha coluna fixa FIEL DA BALANÇA no blog OCEANO NOTURNO
DE LETRAS – Rio de Janeiro (RJ), em 14/8/17.
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