Ipê Rosa. Foto: TLGMorais
A Intolerância Nossa de Todo Dia
Lendo
sobre as cenas de selvageria após o clássico Vasco e Flamengo na noite do
último sábado, no estádio São Januário no Rio de janeiro, em que houve até
morte, me pus a refletir o quanto somos narcisistas e intolerantes, sobretudo
se estamos em grupos, o que nos dá a impressão de invisibilidade e
inimputabilidade. Infelizmente não foi algo inusitado ou isolado, não acontece
apenas no Rio e nem com as torcidas daqueles clubes rivais. Em Belo Horizonte,
há alguns anos, houve um massacre de um torcedor do Cruzeiro por animais
travestidos de torcedores do Galo e nem era dia de jogo ou houvesse alguma
provocação. Simplesmente mataram o rapaz por ser torcedor de outro time, sem
lhe dar a menor oportunidade de se defender. Há uns 20 anos, depois de uma
final da Copa São Paulo de Futebol Junior, houve cenas de assassinato ao vivo
na TV e aquelas imagens ficaram sendo exaustivamente repetidas, por semanas.
Estas cenas se repetem em todos os estados, sejam quais torcidas forem.
Estamos
vivendo num tempo de tamanha intolerância que basta torcermos por um clube que
não seja o da preferência do outro, termos uma posição política que contrarie a
do outro, ou opção sexual, cor da pele, raça, religião “diferentes” que
estaremos sujeitos a sermos achacados em redes sociais, sermos agredidos com
palavras e fisicamente em qualquer lugar que estejamos e até sermos mortos por
isto. E, toda esta intolerância é, a cada dia, mais incentivada nas redes
sociais. São milhões de pessoas exortando o uso de armas, o “fazer justiça” e
repercutindo vídeos e notícias de selvagerias e vinganças como aquele caso do
rapaz que teve sua testa tatuada. De fato, quem comete crimes tem de ser
punido, mas para isto tem de ser julgado e condenado por quem de direito. Se
nos pusermos à caça de todos, por qualquer motivo, um dia também seremos
caçados. E o que mais entristece e preocupa é que esta onda de intolerância
está infiltrada em todas as classes sociais, tanto entre os ignorantes, quanto
entre os intelectuais. Encontram-se intolerantes viscerais entre homens e
mulheres, crianças e idosos, gregos e troianos. E o que mais nos deixa
perplexos é vermos que, em sua maioria, quanto mais intolerantes, mais falam de
Deus, mais postam mensagens de paz, num paradoxo digno de estudos. Numa clara demonstração
daquela máxima do velho cacique da política aqui da roça: “Para os companheiros tudo, para os adversários chibata e água com
sal!”
A morbidez também está
assustadoramente grande: se se tem um acidente, principalmente sendo grave, as
pessoas se põem em risco, parando em rodovias movimentadas para ver, filmar e
fotografar; se há uma briga, ao invés de tentarem evitar, de separarem, ficam
assistindo e filmando; corpos mutilados são fotografados e publicados em redes
sociais; aqui na minha cidade que é pequenininha e que as notícias se espalham
rapidamente, basta que aconteça um acidente ou um assassinato para que a cidade
toda se desloque para o local, o que é deveras lamentável. É degradante ver as
pessoas deixarem seus afazeres domésticos ou no trabalho, saírem de suas casas
com tempo frio ou quente, com sol ou chuva para assistirem “in loco” a desgraça
alheia.
Não é
assim que construiremos a paz. Uma semana de gentilezas e harmonia a todos nós.
Publicação de minha coluna semanal FIEL DA BALANÇA no blog OCEANO NOTURNO DE
LETRAS – Rio de Janeiro (RJ), em 11/7/17.
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