À
minha época, a infância na roça era um tempo de pouco ou quase nenhum brinquedo
industrializado e nenhuma diversão eletrônica, exceto o velho e bom rádio de
pilha (normalmente sintonizado na Rádio Globo do Rio, Rádio Record de São Paulo
ou Rádio Atalaia de Belo Horizonte. Esta última uma espécie de FM quando estas
ainda não existiam. Pelo menos aqui por estas bandas). Mas as crianças não
tinham acesso àquele que era o maior luxo das famílias. E, nos contentávamos em
construir nossos próprios brinquedos, invariavelmente de restos e cacos; de
inventar peripécias, pescar, caçar passarinhos, ouvir as histórias dos mais
velhos (verídicas, lendas e os famosos contos de fada) e trabalhar, que era uma
das formas de entretenimento e, como dizia meu avô: “Trabalho de menino é pouco, mas quem desperdiça é louco!”
Mas um
capítulo à parte em nossas venturas, aventuras e desventuras eram os muitos
perigos a que estávamos sujeitos diuturnamente. Para se ter uma ideia do tanto
de riscos que corríamos vou elencar algumas destas tantas ameaças às nossas
vidinhas de tantas e tão grandes preocupações:
·
Fazer careta (se ventasse,
trovejasse ou o sino tocasse, ficaria assim para sempre. Mas, apesar de crermos
e temermos este destino terrível, não deixávamos de organizar nossos
campeonatos de distorções do rosto);
·
Bater na mãe (a mão secava.
Inclusive, na capelinha perto de minha casa tinha o exemplo do menino, que de
tanto bater na genitora, virou corpo. O padre é que não permitia que crianças
vissem, mas todos os adultos já tinham visto. Desde o início dos tempos);
·
Ser mordido por cágado. (Você
estava literalmente cagado, pois o bicho só soltaria se o sino batesse. Eu pelo
menos, nunca vi um destes quelônios na igreja e nem muito menos ninguém com um
deles agarrado ao dedão. Mas que, se mordesse, era fatal);
·
Dormir nu. (O Anjo da Guarda o
abandonaria.);
·
Brincar com fogo (faria xixi na
cama. Normalmente dormíamos tão preocupados com esta ameaça que, uma vez ou
outra, acontecia. );
·
Contar estrelas (daria verrugas na
mão. Contávamos para conferir se era verdade);
·
Chupar laranja e tomar café logo em
seguida (dava "tiriça", que é um dos nomes a que se davam a
hepatite);
·
Andar de costas (a mãe morreria);
·
Varrer casa com alguém dormindo
(pessoa da família morreria);
·
Dizer que morreram tantos sem a
seguinte imprecação: "Morreram dois! Três com a parede da igreja".
Por exemplo! (Você seria o próximo!)
Mas, driblamos os perigos. Sobrevivemos incólumes a todos eles e,
se assim não fosse, hoje eu não estaria aqui, contando estas histórias para
vocês. Uma excelente semana a todos, sem correr perigos.
Publicação em minha coluna semanal FIEL DA BALANÇA no blog OCEANO
NOTURNO DE LETRAS – Rio de Janeiro (RJ), em 17/7/17.
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